O país lucraria mais de R$ 40 bilhões por ano, se todos os resíduos fossem reaproveitados, no campo e nas cidades. O grande potencial do reaproveitamento de resíduos foi destacado pelo pesquisador do Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais (Ivig) da Coppe/UFRJ, Luciano Basto, no encontro "O futuro sustentável - Tecnologia e inovação para uma economia verde e a erradicação da pobreza", na Rio+20, e serve de munição para os defensores da reciclagem.
"O número do prejuízo com o descarte inadequado pode ser ainda maior, já que falta um melhor controle da destinação final. Ninguém acompanha a coleta diária nas pesquisas. O IBGE chega aos números com um questionário anual nas prefeituras, que é extenso, mas não traz o detalhamento da composição dos resíduos, dado importante para a gestão", explica Basto.
Atualmente, 42% dos resíduos brasileiros têm uma disposição inadequada, segundo a professora do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ, Alessandra Magrini. Ela ressaltou, ainda, que muito lixo ainda não é coletado nas cidades e que 32% dos recicláveis são dispersos de qualquer jeito.
"Cada brasileiro produz 400 quilos de resíduos por ano, e o número tende a crescer, com mais consumo. Nos países ricos, como os EUA, onde o consumo já foi de mil quilos por pessoa, a produção chega a 750, com a adoção de mudanças de hábitos", diz Alessandra.
Já o presidente da Associação de Catadores de Material Reciclável de Jardim Gramacho, Tião Santos, frisa que o mundo ficou pequeno para tanto lixo. "A reciclagem é a saída para diminuir o impacto ambiental e social. No Brasil, que ainda não chegou ao estágio de ter apenas aterros sanitários, a reciclagem surgiu no combate à pobreza. É preciso romper o preconceito diante do lixo, mostrar que reciclá-lo não é coisa de pobre, mas de gente inteligente", ressalta Tião.
Alessandra Magrini acredita que uma saída é a redução da produção de resíduos, com princípios de química, e engenharia verde, otimizando plantas industriais:
"Também podemos melhorar os produtos, com ecodesign e a previsão de que possam ser reciclados em partes, além da desmaterilização. Uma ecologia industrial, com sinergia, pode proporcionar a troca de resíduos reaproveitáveis entre empresas. Já estamos fazendo isso em distritos industrais do Estado do Rio."
Para Luciano Basto, que também é integrante do Painel Brasileiro sobre Mudanças Climáticas, a coleta seletiva tende a crescer, com a maior conscientização ambiental.
"O avanço é inegável. Na Rio 92, estavámos no Aterro do Flamengo expondo uma lixeira com quatro compartimentos, hoje a Coppe mostra como evoluiu a tecnologia brasileira na área, o que torna o nosso desafio maior", conta Luciano.
Na Rio 92, Tião Santos tinha 13 anos e catava lixo em Gramacho desde os 11, com sete irmãos: "Lembro de tudo, principalmente de que a conferência mudou nossas vidas para melhor. Logo depois, os lixões tiveram que se adequar para virar aterros sanitários, com canalização do gás metano e cobertura de argila sobre o lixo. Veio também a legislação pela erradicação do trabalho infantil. Aos 15, tive que sair de lá e fui trabalhar como açougueiro."
Para ele, a percepção sobre a conferência também evoluiu. "Antes, a cidade estava com a segurança reforçada para receber líderes mundiais e um pessoal no Aterro do Flamengo que parecia meio doidão. Agora, com a Rio+20, a preocupação com o planeta é um fato para a maioria. De lá para cá, a reciclagem cresceu muito e os lixões começaram a acabar", diz.
Com o fechamento do depósito de Gramacho, 60 catadores trabalham na cooperativa e outros 500 estão cadastrados para iniciar o trabalho com reciclagem. Tião lembra que continua a luta para a valorização do profissional:
"Com a economia em crescimento, o Brasil gerará mais resíduos e será preciso evitar o desperdício por falta de reciclagem. Mas o sistema tem que deixar de ser predatório, desumano e desigual. No retorno financeiro, nem 10% chegam ao catador."